quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Capitulo 2 - Em cima da hora

Alex deu as costas ao quase irmão Dado e por alguns segundos ficou parada no mesmo lugar. Seus olhos se estreitaram, esquadrinhavam o barracão procurando algo ou alguém, e enquanto procurava, diversas lembranças afloraram-lhe à mente. Lembrava-se do seu primeiro dia ali, ás vésperas de algum carnaval há muitos anos atrás, quando ela, Dado e as outras crianças do abrigo foram levadas para lá com o intuito de fazer alguma oficina, como em esses projetos da comunidade. Dado logo aprendeu a sambar e em pouco tempo já dançava gafieira em festivais, já ela, Alex, encantara-se com a música. Ela se lembrava do quão ficara maravilhada ao ver a bateria ensaiando, a sincronia, o ritmo, as cores...Tudo a encantava, e viu ali um pequeno prazer que lhe desviava a atenção da vida difícil que levava. E ali, somente ali, sentia-se plenamente feliz.


Como já era de se esperar, os anos se passaram e lá estava ela novamente em mais um dia de carnaval, ainda perdida em seus pensamentos. Quase não notou que um par de mãos morenas e macias lhe acariciavam os cabelos lisos e curtos por trás, só despertou de sua nostalgia quando sentiu os lábios quentes da mulata roçando em sua orelha. Alex sorriu. Virou-se suavemente, e seus olhos, muito escuros, encontraram-se com os olhos castanhos claros e cintilantes de Lena, uma das porta-bandeira. Lena envolveu seu pescoço com os braços, ela era um tanto menor do que Alex, que tinha elegantes 1,77m, caindo muito bem em seu corpo sarado e pele muito alva. Alex retribuiu o abraço, segurando-a pela cintura com seus braços musculosos, porém ainda femininos.
-Minha linda...-Alex sorria cinicamente, seu sorriso de dentes perfeitos.
-Adoro essa sua voz rouca...grave...é tão sexy Alex...
Alex fingiu tentar beija-la, ali, em pleno barracão, mas Lena desviou-se, olhou em volta, e tornou a encará-la
-Tá doida pequena? Não ta vendo meu pai ali não?
Alex, ainda sorrindo, viu por cima da cabeça da moça seu colega de bateria, e também pai de Lena, ensaiando, como ela já deveria estar fazendo.
-Pro caralho com teu pai mulher...vem aqui comigo...
E saiu puxando Lena pela mão para o lado de fora do barracão, mesmo sob os protestos da garota. Alex sabia perfeitamente como convencê-la.
Alguns minutos depois Lena estava quase despida de sua fantasia, e ela e Alex suavam em um canto isolado, como já haviam feito tantas vezes, sussurrando e tocando-se, em meio ao sexo sem compromisso que praticavam de vez em quando. Mas mesmo durante um momento de prazer, a vida ensinara Alex a ficar alerta o tempo todo, então não foi difícil para ela identificar o movimento suspeito que começara a alguns instântes.
Dois homens de terno, um alto, pouco cabelo, vinha na frente, seguido por um mais baixo e meio gordo, aproximavam-se do barracão em meio a multidão de pessoas que ali estavam. Alex congelou de súbito.
-O que foi meu amor? Fiz algo de errado? –Lena tentava compreender a interrupção
-Puta que pariu...fudeu gata...
-O que? Ta louca? O que fudeu Alex?
-Os canas morena, os canas!
-Ai minha Nossa Senhora das Dores...em pleno carnaval Alex? Tu não pagou eles de novo?
-Que pagar o que morena? Ta doida? Pensa que eu planto grana no quintal? Era pra eles aparecerem só semana que vem!
Alex viu os homens conversarem com alguém que estava na entrada do barracão, e sem pensar duas vezes, largou Lena ali onde estavam, e saiu correndo pelos fundos, já discando o número em seu celular.


***


A figurinista estava correndo pra todos os lados. Dado divertia-se com uma cerveja gelada em uma mão e um chapéu que faria parte de sua fantasia na outra, sambando com a filhinha do puxador, uma garotinha agradável de uns 7 anos de idade. Dado também lembrava-se bem do primeiro dia no barracão, sabia que onde quer que estivesse, naquele momento, Alex pensava o mesmo que ele. O que aquele lugar tinha de mágico para ambos, ninguém conseguiria sequer imaginar...tem certas coisas que só se sabe quando se vive.
O samba-enredo daquele ano ecoava por todos os lados. Dado olhou para a bateria ensaiando e procurou Alex com os olhos, mas como não a encontrou, continuou sambando. Não se passou muito tempo até que Ramon viesse ao seu encontro. Dado já esperava que o jovem loiro, atlético, viesse lhe procurar a qualquer momento, afinal, naquela data faziam três anos que os dois haviam se conhecido e tido sua primeira noite juntos, e Ramon sempre fôra caxias com datas.
-Ora ora...Dado...bela fantasia...
-obrigado Ramon, a sua também.
-gostaria de trocar umas palavrinhas antes de irmos pra avenida, seria possivel?
-olha Ramon, eu até gostaria, mas...
-não, não gostaria. Se realmente quisesse não começaria o assunto inventando uma desculpa.
Dado passou a mão pelo cabelo quase inexistente, que ele cortava bem curto pra facilitar de arrumar. O suor já brilhava em sua pele morena, bronzeada pelo sol.
-Ramon...cara...isso é mesmo preciso?
-eu tenho grana, posso pagar.
Ramon tirou a carteira do bolso e começou a contar as cédulas.
-vai a merda! Não preciso do teu dinheiro de mauricinho! As coroas que eu pego me pagam muito melhor! Vai pro inferno com tuas gracinhas!
Dado detestava que tentassem comprar sua atenção. Aquilo era seu trabalho, era daquilo que ele vivia, mas não era por isso que qualquer viadinho apaixonado poderia chegar metendo dinheiro em sua cueca em um dia sagrado como aquele.
-Qual é Dado? Pega a grana cara...
Dado irritou-se mais ainda, preparou-se para agredi-lo, e seria exatamente o que aconteceria se naquele exato minuto seu celular não tocasse.

***

-Alô?
-Dado...eu to fudida cara...os canas tão aqui...aqueles filhos da puta...
-Porra...Alex...e agora? Caralho, tu não tem pra onde se entocar?
-Que se entocar o que Dado? Daqui a uma meia hora a gente vai sair daqui pra ir pra avenida...queres que eu faça o que?
-Não sei! Deixa eu pensar...da um balão, volta depois!
-eles não vão sair sem a grana deles Dado!
-Caralho...e tu não tens aí?
-Toda não, eu comprei aquele som pro carro, aquele maldito bar pra sala...
-ta beleza, ta beleza, faz assim...bora atrás do Chulé que ele ta te devendo...
-tô te esperando no carro.

***

Alex sentou-se no banco do motorista e colocou os dedos entre os cabelos, muito pretos, e agora em total desordem. Dado chegou logo, e eles sairam em direção a favela onde cresceram.
Sempre fôra assim entre eles, se um precisava, o outro resolvia, fosse com os rolos de tráfico de Alex, ou os maridos traídos tentando matar Dado.
O conversível de Alex já era respeitado no lugar, mesmo entre as gangues rivais, ninguém mexia com ela no local onde ela comandava a venda de drogas, para os novatos, era só a “branquela” que cresceu ali e se deu bem na vida, mas para os antigos, era a Alexandrinha, lá do abrigo, que agora comandava a parada “responsa”.

Um comentário:

  1. ;B
    Que medaaa!! Gentee.. Ela é tudããããdibom!!!

    Tá ficando muito boomm, já quero ler mais!!

    ResponderExcluir