sexta-feira, 6 de março de 2009

Capítulo 4 – Desencontros e Encontros

Alex arrumou a gola da camisa, assumiu aquela expressão de canalha conquistadora que ela fazia como ninguém, e saiu andando em direção da linda moça que a observava, mas esta, ao notar a aproximação de Alex, assustou-se e saiu quase correndo pelo meio da multidão. Alex parou por alguns segundos como se houvesse acabado de levar um tapa, demorou um pouco pra crer que a garota tinha realmente fugido dela, mas quando compreendeu finalmente isso, acelerou o passo e tentou segui-la. Impossível. Haviam pessoas espalhadas por todo lado, e todas elas pareciam terminantemente decididas a colocarem-se em seu caminho.
Mais ou menos vinte minutos depois, Alex ainda vagava perdida no meio da multidão, na esperança de encontrar aqueles cabelos ondulados, castanhos e brilhantes em algum lugar, mas depois de tanto tempo, finalmente se deu conta de que estava sendo ridícula em ficar andando sem rumo e esbarrando em todo mundo, e deu um jeito de sair dali. Alex ganhou a calçada finalmente, respirou aliviada pela primeira vez naquele dia inteiro que fôra tão corrido, e passou a mão pelos cabelos, agora suados e grudando na nuca. Ela estava parada, encostada em seu próprio carro, quando seu celular tocou.
-arf....alô? –Alex atendeu com a grosseria habitual.
-Oi, Alex?
-Ela...
-Oi Alex...aqui é o Caíque, lembra de mim? Amigo do Fabiano...
-Hã, sei, que tu quer?
-Cara...tá rolando uma festa no apê do meu amigo aqui em Copacabana...rola tu trazeres uns dez gramas pra mim aqui?
-...não sei...tô cansada velho...
-Cara, te pago até a mais, é que ta todo mundo fissurado aqui, tentei te ligar mais cedo..
-ta, ta, ta...mas vai te custar quatrocentos só pela sacanagem de me fazer dirigir até aí em pleno carnaval, ta ligado?
-De boa, de boa...tu chega em quanto tempo?
-Vou ter que ir buscar que ainda não tenho aqui comigo e daqui com uma hora eu apareço.
-Ta beleza.
Alex desfrutou de mais alguns segundos de paz, e em seguida entrou no carro. Teria que fazer mais uma viagem até a favela onde acabara de assassinar alguém.

**

Dado viu a quase irmã seguir a moça, e sorriu. “Ela não tem jeito”.
As pessoas da escola iam se dispersando, ocupando seus locais para assistir os outros desfiles, ou aglomerando-se em pequenos grupos de comemoração antecipada. Dado sentiu uma mão tocar seu ombro nu e virou-se, ficando de frente para Jaqueline, uma das organizadoras do desfile, e também uma de suas clientes.
-Oi Dadinho...você esteve tão lindo hoje!
-Obrigado dona Jaqueline.-Dado sorriu cafajeste.
-Não tem o que agradecer, e eu já disse um milhão de vezes querido, pra você, só Jaqueline...
-Ora ora...então tudo bem...Jaqueline.-Dado já dizia isso quase no ouvido da mulher de já mais de quarenta anos, mas ainda muito charmosa.
-O que vai fazer agora Dadinho querido? –Jaqueline já estava visivelmente excitada e ansiosa por mais um encontro a sós com o jovem sedutor.
-estava pensando em ir ao barracão ...com o resto do pessoal...mas se tiver outros planos...podemos conversar...
-Não se preocupe meu lindo, vamos ao barracão e de lá tomamos outros rumos...também preciso ir até lá...
Enquanto Dado conversava com Jaqueline distraidamente, não percebeu a aproximação desagradável que estava por vir.
-Como a senhora...digo, como tu quiser Jaqueline...
-assim que eu gosto garotão...
-Ora ora Duduzinho...quanto tempo! –a voz desta vez era grossa e bêbada, e vinha não mais da frente de Dado, e sim das costas, e o rapaz levou um susto tamanho, que largou no mesmo instante a cintura de Jaqueline e virou-se de súbito.
-Ca-Carlos? O que faz aqui? –Dado encarou aquele rosto que ainda o apavorava, já desgastado pelo tempo, mais enrugado, com a barba por fazer, mais sujo, porém com o mesmo cheiro de álcool e suor que ele tão bem se lembrava, aquele homem que lhe fazia esquecer que era o Dado, e o belo e sedutor homem no qual se tornara, e o fazia sentir-se apenas o Dudu, o garotinho magro, machucado e indefeso, que um dia fugiu daquele homem levando apenas um par de sapatos velhos e um canivete enferrujado. Naquele momento, Dado era aquele garotinho novamente.
-Ora Dudu...não posso vir ver como está meu filhinho?
Dado explodiu, de repente toda a alegria do carnaval tornou-se um misto de enorme fúria, medo e agressividade, e Dado agarrou aquele braço cabeludo e gordo com sua mão mais forte, e saiu puxando o homem pelo braço para longe dali, longe do barulho e das pessoas, e foi só quando ganharam um espaço deserto, que Dado se pronunciou novamente, mas desta vez aos berros.
-O QUE TU QUERES AQUI SEU PERVERTIDO NOJENTO? FALA! FALA PORQUE ME VER QUE NÃO É...-Dado ria desfiguradamente, numa ironia que expressava todo o seu ódio –NÃO...TU NUNCA APARECE PRA ME VER SEU FILHO DA PUTA...MAS HOJE É CARNAVAL TA VENDO ALI? HOJE É O DIA MAIS FELIZ DO ANO...E TU VENS AQUI TENTAR ROUBAR ESSE MOMENTO DE MIM? ROUBAR A ÚNICA ALEGRIA QUE ME RESTA? JÁ NÃO ROUBOU O SUFICIENTE DE MIM?
-Dudu...pra que tanto ódio do seu velho pai que só está precisando de um trocado emprestado...pra que toda essa gritaria rapaz?
-NÃO ME VEM COM ESSAS CHURUMELAS CARLOS E NÃO OUSA SE REFERIR A SI MESMO COMO MEU PAI NOVAMENTE? QUER DINHEIRO PRA TUA CACHAÇA E AS TUAS PUTAS? VAI TRABALHAR SEU VAGABUNDO! NÃO CONTA COMIGO PRA ISSO TA LIGADO?
-me respeita rapaz que eu sou teu pai! –agora o tom era definitivamente agressivo.-Passa logo essa grana pra cá e para com essa gracinha de querer me desafiar! Olha só quem ta me mandando trabalhar! TU NÃO PASSAS DE UM PUTO, SEU MOLEQUE, UM MICHÊ BARATO SUSTENTADO POR UMA SAPATÃO NOJENTA E UM MONTE DE VELHA MAL COMIDA!

Dado não conseguiu mais raciocinar, de repente tudo voltara a sua mente, a fuga de casa, a chegada no abrigo, ele doente e Alex cuidando dele, ele com fome e Alex roubando comida para ele, ele sem ter onde morar após a maior idade e Alex lhe levando pro na época pequeno apartamento que alugara pra si própria na favela, ele precisando, Alex sempre pronta pra ajudar...aquele homem podia falar de quem quisesse ali, mas nunca mais ousaria falar assim de sua irmã, nunca mais.
O homem cheirando a álcool sentiu um punho quente lhe acertar o rosto, depois outro e mais outro, Dado socava o próprio pai sem piedade, e o fazia cegamente, até deixa-lo no chão e cuspir nele.
-eu não tenho mais medo de ti Carlos, eu já sou homem, tenho vinte e quatro anos, e não sete, se é que tu sabes contar.
Dado deu as costas a ele, e voltou para a folia.

***

Alex pegou a mercadoria na favela, entrou em seu carro, e já estava girando a chave pra sair dali, quando ouviu um barulho por ela muito conhecido muito próximo de sua orelha esquerda. “clic”. Uma arma acabara de ser engatilhada, e ela sentiu em seguida o metal frio encostar em seu rosto.
-Pode ir parando aí vadia. Já ta todo mundo sabendo que foi tu que matou o Chulé...
Alex reconheceu a voz e nem ousou virar o rosto para encarar o dono dela.
- Ok neguinho, eu matei mesmo teu irmão, e dái? O cara tava me devendo e tu sabe como a parada funciona, mas se tu me matar agora, ta morto amanhã, então abaixa essa buceta que eu tenho serviço.
-ABAIXA O CARALHO! TU VAI MORRER SUA PUTA! TU VAI MORRER É AGORA!
E no mesmo momento, Alex ouviu uma segunda voz juntar-se a primeira, ela também a conhecia, e sabia pertencer a Canarinho, que costumava ser seu parceiro de pequenos furtos na adolescência.
-Tu ta ficando doido manézão? Tá tirando a Alexandrinha? Filha do finado Argentino? Tu ta ficando doido? –e Alex ouviu um segundo gatinho- tira essa porra da cabeça dela antes que eu estoure teus miolos seu ladrãozinho de merda...tu ta sabendo que teu irmão vacilou com a gata, ela cobrou e ta é certa, ninguém mais agüentava aquele puto...agora circulando e trata de tirar isso da cabeça dela que é minha considerada que ta nesse carro.
Alex sentiu o metal abandonando seu rosto, e então virou-se para olhar nos olhos quem lhe ameaçava.
-Tu escapou por pouco vadia...-Alex viu aqueles olhos negros brilharem de raiva, mas não se intimidou.
-Tenta a sorte neguinho...que o que é teu ta guardado...valeu Canarinho! Fico te devendo essa.
-Vai na paz gostosa, deixa que com esse aqui eu me entendo!
Alex acelerou e não olhou pra trás.
Após ter feito a difícil entrega no apartamento dos playboys e de ter cheirado umas carreiras com eles, anotado os telefones de algumas patricinhas que se interessaram nela e tomado algumas doses de wiske importado, Alex retornou ao barracão, com a intenção de encontrar Dado. O rapaz lhe recebeu com entusiasmo, e pareceu ter esquecido que ela saíra dali inicialmente com a intenção de ganhar uma garota. Muitas cervejas, muito pó e muito samba entraram pela manhã de terça feira, as pessoas em vez de exaustas, ainda estavam ali com todo o gás. Alex já sentia-se absurdamente bêbada, quando a viu novamente.
Seria efeito do álcool, ou ela era ainda mais bonita sob a luz do dia? Seria uma miragem, ou aquela mulher linda, com aqueles belíssimos olhos azuis e cabelos só vistos em comerciais de shampoo estava ali novamente encarando Alex, mas desta vez sorrindo? Desta vez, Alex nem teve chance de levantar-se e ir até ela, a moça linda de horas mais cedo agora vinha em sua direção, como se flutuasse no lugar de andar, e parou em sua frente, fixando seus olhos azuis cintilantes nos negros e profundos olhos de Alex.
-Tá, ta bom...eu cheirei demais, tive uma overdose, morri, tu és o anjo e o céu é carnaval...-Alex mesmo bêbada, conseguia cantar a garota, que apenas sorriu, colocou a mão em seus cabelos em desordem, e a fez sentar, sentando-se ao seu lado em seguida.
-Você bebeu demais querida...compreensível, porque é carnaval...mas não sou anjo, e você, felizmente, não está morta...mortos não fazem certas coisas que eu gostaria que você fizesse.-a moça devolveu o sorriso sacana que Alex lhe oferecia.
“não acredito...eu só posso estar porre demais e imaginando coisa...é impressão minha ou essa puta gata ta me dando o mó mole a essa hora da manhã e eu to doidona e vacilando? Não, não viaja, não vi-a-ja...eu vou ficar boa e vou comer ela...ta doido? Eu sou a Alex, não sou qualquer uma...”
-opa...gostei muito desse tom gatinha...
-quer sair daqui? Ou ainda ta afim de tomar mais uma dose?
-“mais uma dose, claro que eu to afim...” sempre...mas desta vez, é mais uma dose de outra coisa.
Alex levantou-se, deu a mão para ajudar a moça a se levantar, a moça passou a mão em sua cintura, Alex a abraçou, e elas saíram do barracão, em rumo ao carro de Alex.
Dado dançava com uma bela morena, quando escutou de relance um dos principais patrocinadores da escola comentar com alguém:
-Quem é aquele rapaz ali de costas saindo abraçado com a minha filha?
Dado por curiosidade olhou pra porta, e viu Alex saindo abraçada com uma garota linda.
-Puta que pariu...isso vai dar merda.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Capitulo 3 – O encontro do verde e rosa

Correram até onde se entocava Chulé. Esse que ganhou o apelido por ser sempre a coisa mais mal cheirosa e baixa que se prende a você. Um homem aparentemente frágil, porém, perigoso. Sempre com suas artimanhas preparadas. Traficante, assassino de aluguel. Sangue frio.

- Aê mermão… onde está a grana da gostosa?

- Calma aí, seu Eduardo.

- Calma é o caralho, Chulé. Paga agora ou eu vou apagar você.

- Eu não tenho grana aqui não, cara.

- Se vira.

- Aqui, Chulé, ou você me dá a grana que me deve ou eu rodo na mão dos canas. E tu vens junto como brinde.

- Calma, Alex. Eu acho que tenho algo aqui.

Ela soltou o colarinho daquele homenzinho baixo, com aparência suja e pouco cabelo. Chulé foi até uma parte da parede que escondia um cofre atrás de um pôster do Vasco da Gama. Ele começou a tirar notas daquele cofre, Dado se aproximou e foi pegando o dinheiro. Chulé, sem que Dado percebesse, pegou uma arma, mas antes de atirar em Dado, uma bala o acertou. Alex atirou na cabeça de Chulé. Eles pegaram o dinheiro e correram para o carro.

- Mete o pé aí, sua cachorra. Estamos mais do que atrasados. Você tem que pagar os caras e temos que voar para o Sambódromo. Você não quer que a nossa Mangueira entre sem a gente.

- Cala a boca. Eu tou indo o mais rápido que eu posso.

- Será que vão descobrir que fomos nós?

- Que se foda esse povo. Ninguém mais aturava aquele desgraçado. Fiz um favor à humanidade e à policia.

- Valeu, então mete o pé, maninha.

- Ta Dudu.

- Dudu no seu cu. É Dado.

- Eduardo, você sempre será para mim o meu irmãozinho mais novo. Será sempre o Dudu, mesmo quando você queira ser o macho da relação.

- Foda-se esse papo meloso, sua cadela. Vai rápido.

- Chegamos, seu puto.

- Já é. Corre lá para a bateria, vou terminar de vestir a fantasia.

***

Eles chegaram quando a escola anterior estava começando a passar pela a avenida. Eles se vestiram, se prepararam e começaram a se aquecer. Dado começou a cantar o samba enredo para que todos em sua volta entrassem no clima. A sua voz foi acompanhada por cada vez mais vozes animadas.

Os olhos de cada integrante daquela escola brilhavam. Era a Mangueira a próxima escola a desfilar e brilhar. Fazer as pessoas sorrirem e entrarem naquela fantasia chamada carnaval.

Arrepio à flor da pele. Aquela noite de carnaval não era só mais uma. Toda vez que entrava a Mangueira, uma espécie de magia contaminava a todos. Dentro e fora do Sambódromo. A alegria contagiava, as cores verde e rosa pareciam um hino ao amor.

A bateria da outra escola já saía, a Mangueira já esquentava, o puxador com o samba na boca e os passistas com o ritmo no pé se preparavam para o desfile de suas vidas. Todos os desfiles são como se fosse o primeiro e o último de tanta alegria que impulsiona aquela massa. Uma vida para o samba.

O surdo impulsiona a escola, como fosse a freqüência cardíaca de todas aquelas pessoas, de toda uma nação. E a saudade aperta no coração de muitos sem o mestre Jamelão ali com a sua voz grave encantando e surpreendendo a cada ano que passa.

A escola começou e presentear o seu público com euforia e beleza. As pessoas ficaram de pé para ver a Mangueira passar na avenida, que merecia um tapete para tanta maravilha. Um fantástico mundo feito de seres humanos e sonhos.

A batida forte de Alex e o seu sorriso contaminava os seus amigos de bateria, que não cansavam. Dado em passos frenéticos, cantando, sempre malandro… o suor no rosto, o sorriso, a letra cantada até a voz sumir. Os dois apaixonados por aquele mundo. Os dois irmãos sem querer. Irmãos porque o destino quis. Os dois que podiam ser humilhados pelas as suas escolhas, mas eram fortes. Se um caia o outro ajudava a levantar. Um amor sem explicação. Só se sabe que existe. Como existia um grande amor dos dois por aquela nação que os abrigou. A nação Mangueirense.

***



Fim do desfile.

Ele a esperou. Ela sempre era última junto com a bateria. Tempo depois ela chegou ali e ele a abraçou aos gritos.

- Vamos ganhar essa porra esse ano! Estava tudo lindo. A bateria perfeita. Todos nós cantamos. Estou até arrepiado. Foda! Foda! Foda!

- Vamos sim, Dado. Este é o nosso ano. Eu sinto isso também.

- Quarta feira vai ser foda. Vou gritar muito. Nem vou trabalhar.

- Você é um vagabundo mesmo.

- Aê Alex, aquela gostosa ta te secando.

- Ah é? Hum… o meu número. Maninho, a gente se vê em casa. Não me espera.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Capitulo 2 - Em cima da hora

Alex deu as costas ao quase irmão Dado e por alguns segundos ficou parada no mesmo lugar. Seus olhos se estreitaram, esquadrinhavam o barracão procurando algo ou alguém, e enquanto procurava, diversas lembranças afloraram-lhe à mente. Lembrava-se do seu primeiro dia ali, ás vésperas de algum carnaval há muitos anos atrás, quando ela, Dado e as outras crianças do abrigo foram levadas para lá com o intuito de fazer alguma oficina, como em esses projetos da comunidade. Dado logo aprendeu a sambar e em pouco tempo já dançava gafieira em festivais, já ela, Alex, encantara-se com a música. Ela se lembrava do quão ficara maravilhada ao ver a bateria ensaiando, a sincronia, o ritmo, as cores...Tudo a encantava, e viu ali um pequeno prazer que lhe desviava a atenção da vida difícil que levava. E ali, somente ali, sentia-se plenamente feliz.


Como já era de se esperar, os anos se passaram e lá estava ela novamente em mais um dia de carnaval, ainda perdida em seus pensamentos. Quase não notou que um par de mãos morenas e macias lhe acariciavam os cabelos lisos e curtos por trás, só despertou de sua nostalgia quando sentiu os lábios quentes da mulata roçando em sua orelha. Alex sorriu. Virou-se suavemente, e seus olhos, muito escuros, encontraram-se com os olhos castanhos claros e cintilantes de Lena, uma das porta-bandeira. Lena envolveu seu pescoço com os braços, ela era um tanto menor do que Alex, que tinha elegantes 1,77m, caindo muito bem em seu corpo sarado e pele muito alva. Alex retribuiu o abraço, segurando-a pela cintura com seus braços musculosos, porém ainda femininos.
-Minha linda...-Alex sorria cinicamente, seu sorriso de dentes perfeitos.
-Adoro essa sua voz rouca...grave...é tão sexy Alex...
Alex fingiu tentar beija-la, ali, em pleno barracão, mas Lena desviou-se, olhou em volta, e tornou a encará-la
-Tá doida pequena? Não ta vendo meu pai ali não?
Alex, ainda sorrindo, viu por cima da cabeça da moça seu colega de bateria, e também pai de Lena, ensaiando, como ela já deveria estar fazendo.
-Pro caralho com teu pai mulher...vem aqui comigo...
E saiu puxando Lena pela mão para o lado de fora do barracão, mesmo sob os protestos da garota. Alex sabia perfeitamente como convencê-la.
Alguns minutos depois Lena estava quase despida de sua fantasia, e ela e Alex suavam em um canto isolado, como já haviam feito tantas vezes, sussurrando e tocando-se, em meio ao sexo sem compromisso que praticavam de vez em quando. Mas mesmo durante um momento de prazer, a vida ensinara Alex a ficar alerta o tempo todo, então não foi difícil para ela identificar o movimento suspeito que começara a alguns instântes.
Dois homens de terno, um alto, pouco cabelo, vinha na frente, seguido por um mais baixo e meio gordo, aproximavam-se do barracão em meio a multidão de pessoas que ali estavam. Alex congelou de súbito.
-O que foi meu amor? Fiz algo de errado? –Lena tentava compreender a interrupção
-Puta que pariu...fudeu gata...
-O que? Ta louca? O que fudeu Alex?
-Os canas morena, os canas!
-Ai minha Nossa Senhora das Dores...em pleno carnaval Alex? Tu não pagou eles de novo?
-Que pagar o que morena? Ta doida? Pensa que eu planto grana no quintal? Era pra eles aparecerem só semana que vem!
Alex viu os homens conversarem com alguém que estava na entrada do barracão, e sem pensar duas vezes, largou Lena ali onde estavam, e saiu correndo pelos fundos, já discando o número em seu celular.


***


A figurinista estava correndo pra todos os lados. Dado divertia-se com uma cerveja gelada em uma mão e um chapéu que faria parte de sua fantasia na outra, sambando com a filhinha do puxador, uma garotinha agradável de uns 7 anos de idade. Dado também lembrava-se bem do primeiro dia no barracão, sabia que onde quer que estivesse, naquele momento, Alex pensava o mesmo que ele. O que aquele lugar tinha de mágico para ambos, ninguém conseguiria sequer imaginar...tem certas coisas que só se sabe quando se vive.
O samba-enredo daquele ano ecoava por todos os lados. Dado olhou para a bateria ensaiando e procurou Alex com os olhos, mas como não a encontrou, continuou sambando. Não se passou muito tempo até que Ramon viesse ao seu encontro. Dado já esperava que o jovem loiro, atlético, viesse lhe procurar a qualquer momento, afinal, naquela data faziam três anos que os dois haviam se conhecido e tido sua primeira noite juntos, e Ramon sempre fôra caxias com datas.
-Ora ora...Dado...bela fantasia...
-obrigado Ramon, a sua também.
-gostaria de trocar umas palavrinhas antes de irmos pra avenida, seria possivel?
-olha Ramon, eu até gostaria, mas...
-não, não gostaria. Se realmente quisesse não começaria o assunto inventando uma desculpa.
Dado passou a mão pelo cabelo quase inexistente, que ele cortava bem curto pra facilitar de arrumar. O suor já brilhava em sua pele morena, bronzeada pelo sol.
-Ramon...cara...isso é mesmo preciso?
-eu tenho grana, posso pagar.
Ramon tirou a carteira do bolso e começou a contar as cédulas.
-vai a merda! Não preciso do teu dinheiro de mauricinho! As coroas que eu pego me pagam muito melhor! Vai pro inferno com tuas gracinhas!
Dado detestava que tentassem comprar sua atenção. Aquilo era seu trabalho, era daquilo que ele vivia, mas não era por isso que qualquer viadinho apaixonado poderia chegar metendo dinheiro em sua cueca em um dia sagrado como aquele.
-Qual é Dado? Pega a grana cara...
Dado irritou-se mais ainda, preparou-se para agredi-lo, e seria exatamente o que aconteceria se naquele exato minuto seu celular não tocasse.

***

-Alô?
-Dado...eu to fudida cara...os canas tão aqui...aqueles filhos da puta...
-Porra...Alex...e agora? Caralho, tu não tem pra onde se entocar?
-Que se entocar o que Dado? Daqui a uma meia hora a gente vai sair daqui pra ir pra avenida...queres que eu faça o que?
-Não sei! Deixa eu pensar...da um balão, volta depois!
-eles não vão sair sem a grana deles Dado!
-Caralho...e tu não tens aí?
-Toda não, eu comprei aquele som pro carro, aquele maldito bar pra sala...
-ta beleza, ta beleza, faz assim...bora atrás do Chulé que ele ta te devendo...
-tô te esperando no carro.

***

Alex sentou-se no banco do motorista e colocou os dedos entre os cabelos, muito pretos, e agora em total desordem. Dado chegou logo, e eles sairam em direção a favela onde cresceram.
Sempre fôra assim entre eles, se um precisava, o outro resolvia, fosse com os rolos de tráfico de Alex, ou os maridos traídos tentando matar Dado.
O conversível de Alex já era respeitado no lugar, mesmo entre as gangues rivais, ninguém mexia com ela no local onde ela comandava a venda de drogas, para os novatos, era só a “branquela” que cresceu ali e se deu bem na vida, mas para os antigos, era a Alexandrinha, lá do abrigo, que agora comandava a parada “responsa”.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Capitulo 1 - Doces vícios e doces mistérios

A respiração estava forte, as roupas pelo o chão. A jovem de dezessete anos, loira, de classe alta gemia, berrava, batia no colchão, enquanto aquela mulher de vinte e seis anos a fazia delirar. Até que alguém bate na porta do quarto.

- Filha? Você está bem?

- Seus pais?Eles nãos estavam viajando?

- Caralho! Voltaram antes.

Com todo olhar de cínica, Alex, olhou para a jovem vitima de sua sedução, sorriu e continuou, tampando a boca rósea da estudante do ultimo ano do ensino médio. Até que ela quase desfalecida de tanto prazer murmurou algo que pode ser entendido “você tem que ir agora”.

Após se vestir e pegar sua bolsa com “seus produtos de venda”, ela abre a porta, encontra com os pais da moça.

- Obrigada pela hospitalidade.

- Quem é você?

- Podem me chamar de o lobo mal de saias.

A jovem saiu com toda a classe pela a porta, entrou no seu carro e saiu deixando marcas das rodas na garagem.


***

Ele se vestiu correndo a sua velha calça jeans, pegou a camisa e pulou a janela daquela casa em Santa Tereza, deixando para trás uma mulher procurando explicações para dar ao marido.

Sua pele morena suada, seu sorriso de satisfação e um óculos escuros no rosto. Amante de todos os tipos de sexo. Adora sua profissão de michê. “Satisfação é o meu sobrenome”. Colocou a camisa de botões branca. Tem apenas vinte e quatro anos de vida, uma cicatriz perto do umbigo por uma facada que levara aos treze anos no lugar onde foi criado.

Ganha a vida dando prazer para as mulheres casadas e também aos homens casados. Sempre tem alguém que está insatisfeito ou insatisfeita com o parceiro ou parceira e precisa de que alguém da rua, com ar de vadio ensine a dar valor ao corpo e aos seus desejos.

Ele sai pela a rua caminhando e se insinuando para quem ele acredita que tenha dinheiro e desejos. E quem não tem desejos? Até que o seu celular toca.

Doce
Vício


- Fala maninha de meu coração.

- Maninha é o caralho. Estamos atrasados. Já papou a coroa?

- Papei. A mulher nunca foi tão feliz na vida. E eu com mais grana de um corno no bolso.

- E aí, como está a sua estadia na Barra?

- Acabou! Os pais da cadelinha chegaram. Mas eu me fartei. Ela me deixou mais rica e mimada.

- Você não vale nada, Alex.

- E desde quando você presta, Dudu?

- Dudu só no dia que você me dar o seu cu. É Dado, falô.

- Eu sei, meu gostoso. Onde você está para eu te pegar para a gente ir ao desfile?

- Santa Tereza.

- Porra, vai de ônibus.

- Vai se fuder. Vem me buscar, deixei a minha moto lá na garagem do prédio.

- Se vira, mermão. Você é gostoso, todo gato vai longe.

- Valeu, mas você vai ver quando chegarmos ao barracão.


***

Seus caminhos eram diferentes naquela tarde quente de fevereiro. Mas nem sempre foi assim. Dois órfãos criados em uma entidade que abriga menores abandonados. Alexandra viu sua mãe ser morta pelo o pai, e depois ficou sabendo que o mesmo foi morto na cadeia pela facção rival. Eduardo sempre foi espancado e molestado pelo seu pai, que o criava sozinho desde que a mãe do menino, uma prostituta de luxo, morreu quando estava grávida do segundo filho. Quando não agüentava mais, o menino, ainda com sete anos fugiu, chegando molhado, sujo e faminto ao abrigo que tinha na favela da Mangueira. E foi naquela noite, ele com febre que viu Alexandra pela a primeira vez. Olharam-se e o, então Dudu, desmaiou. De manhã ela estava ao seu lado e disse:

- Nada é fácil aqui também, mas estarei sempre com você.

***

Estavam no barracão para escutar as ultimas instruções. Hoje a mangueira desfilará e eles nunca perderam um desfile. Ela é ritmista, sempre gostou de estar na bateria de sua escola. Diz que ali é o coração de toda uma nação. E ele sempre com samba no pé no chão, auxilia a levar o samba na voz e na emoção. Ele tem o gingado malandro. Ela a força. É desta forma que um colabora que o outro cresça.

- Sua vagabunda, quem te mandou não ir me buscar.

- Olha a língua, rapaz, pois o michê aqui é você. E vamos, que ainda temos que ir sambar muito hoje.